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ARTIGOS

FORMAÇÕES DO INCONSCIENTE: CONSIDERAÇÕES SOBRE O CHISTE

Lia Cunha Poletto
Psicanalista

Uma formação do inconsciente é uma elaboração psíquica e simbólica.

O quê há então de simbólico quando esquecemos datas, nomes e lugares? E quando contamos piadas, quando sonhamos e quando cometemos equívocos, por exemplo?

Em nossas experiências diárias não ficamos pensando se nossos atos, nossos sonhos e nossos esquecimentos são destinados a alguma finalidade. Mas nossa vida é feita de ações que almejam um propósito, elas tem um sentido. Qual sentido(s)?

Foi com Freud, no final do século XIX que teve início o desvendamento desses enigmas, a partir da escuta de suas (seus) pacientes. Que aquilo que a princípio não tinha sentido, na verdade estavam carregados de razões de ser. Assim, depois da Psicanálise tornou-se impossível pensarmos as nossas ações sem serem como formações do inconsciente e como tal, atreladas aos desejos subjacentes presentes no inconsciente.

É possível pensarmos e nos comunicarmos sem a palavra, sem a linguagem?

Só podemos falar nas formações do inconsciente porque elas se manifestam‎ na linguagem. A palavra verdadeira irrompe na fala do sujeito que se esforça para burlar a censura, provocando uma ruptura entre o significante e o significado, permitindo demarcar o desejo inconsciente do sujeito.

A forma pela qual o inconsciente se manifesta é então através da fala, revelando o inusitado, alguma coisa que sempre surpreende.

As formações inconscientes significam sempre outra coisa diferente daquilo que efetivamente aparece, como efeito a ser interpretado.

Partimos do pressuposto de que a Psicanálise é uma forma de desordenamento do que é dito, na direção de um não-saber, pelo avesso ao saber que se tem.

O sonho, o chiste, a piada, o lapso, o esquecimento do nome, atos falhos e o sintoma são todas formações do inconsciente. E não se trata de reencontrar o inconsciente em alguma profundeza, mas de balizá-lo a partir do discurso consciente no ponto onde, sem o sujeito ter desejado, alguma coisa escapa, revelando desejos recalcados oriundos do inconsciente.

O sintoma para Freud e para Lacan é a expressão de um conflito psíquico. É uma mensagem do inconsciente. A palavra que o sintoma aprisiona ao orgânico encontra ressonância na escuta e na leitura do analista.

Nos atos falhos e lapsos são palavras que tropeçam, mas são palavras que confessam. Revelam a verdade, portanto são atos bem sucedidos. Normalmente na vida cotidiana nos desculpamos dizendo: “me enganei, não era bem isso o que eu queria dizer”.

Quanto ao esquecimento de nomes, na verdade não há esquecimento absoluto, porque no lugar do nome esquecido apresenta-se outro ou outros nomes. Aquele nome que foi esquecido não acontece por acaso, se foi esquecido é porque há uma implicação provinda do inconsciente.

No chiste ou dito espirituoso (gracejo, piada) é em “Os chistes e sua relação com o inconsciente” de 1905 que Freud faz estudo criterioso da satisfação que ele provoca e a relação com a vida psíquica. E Lacan no seminário cinco “As formações do inconsciente” de 1957- 1958 revisitando o assunto, traz contribuições significativas para o tema.

A importância que Freud atribuía aos chistes é antiga, remonta aos primórdios da psicanálise. Na sua correspondência com Fliess ele fala de seu interesse pelas piadas sobre judeus e começa a colecioná-las. Ele sempre temperava suas inquietações fundamentais com o relato de chistes.

Segundo Lacan o chiste se produz quando passa do campo da linguagem organizada do signo para a ambigüidade do significante.

Quando uma representação inconsciente é recalcada, retorna de forma irreconhecível, escapando de censura (do ego).

Os mecanismos presentes nos chistes são os mesmos presentes no trabalho do sonho, da elaboração que produz o sonho manifesto, a partir do sonho latente. Esses mecanismos são: a CONDENSAÇÃO (Freud) e Lacan acrescenta a metáfora. É a substituição significante de um significante antigo recalcado por um significante novo ( um substituto é uma nova palavra).

Lacan no Seminário “As formações do inconsciente” relata um chiste apresentado no livro de Freud. Trata-se do conhecido chiste familionário. Heine, poeta e escritor alemão em seu livro “Quadros de Viagens”. O nome do personagem do livro é Hirsch –Hyacinth, que é um espirituoso morador de Hamburgo, agente de loteria e mordomo profissional, que se gaba de suas relações próximas com uma das personalidades mais ricas da Alemanha. Hirsc-Hyacinth comenta então “É certo como Deus há de me prover todas as coisas boas, sentei-me ao de Salomón Rothschild e ele me tratou como seu igual – totalmente familionário.

Para ser um chiste não bastaria dizer “ele me tratou de igual para igual”, é imprescindível o surgimento de algo novo. A novidade, a criação foi o neologismo familionário. Esse neologismo (criação de uma palavra nova, geralmente derivada de outra ou outras já existentes) é o veículo revelador, causando desconserto.

O outro mecanismo presente na formação do chiste é o DESLOCAMENTO, que Lacan realça a presença da metonímia. Na metonímia há deslizamento, transferências. É o desvio do curso do pensamento, o valor psíquico do tema primitivo para um tema diferente. Exemplo é quando falamos o nome do autor de uma obra pelo nome da obra. Também quando falamos “trinta velas” no lugar de “barco a velas”.

A satisfação sentida ao realizar um chiste ou ouvi-lo é que, aquilo que se diz com espírito é aceito com mais facilidade pela censura, de dizer o que se quer dizer sob disfarce.

Quando uma pessoa faz um chiste não precisa manter o recalcamento. Com o recalcamento colocamos de lado e mantemos afastados do consciente aquilo que nos provoca desprazer. Nesse sentido é que podemos dizer que é no retorno do recalcado, de forma travestida que ele pode aparecer.

O chiste libera a energia utilizada no recalcamento e é nessa poupança de energia que encontra o prazer.

Freud dizia “aquele que deixa escapar inocentemente a verdade, na realidade está feliz em tirar a máscara”.

No “Os chistes e sua relação com o inconsciente” Freud coloca que há dois tipos de chistes: os inofensivos ou inocentes e os tendenciosos.

Os inofensivos têm sua origem primitiva a um período lúdico da atividade infantil. Como exemplo Freud cita o episódio em que um rapaz vai visitar uma moça, que esta se vestindo deixa escapar “oh, que vergonha, alguém não poder deixar-se ver, logo quando se esta mais atraente”.

Os chistes tendenciosos ocorrem quando há dificuldades do sujeito lidar com a agressividade, cinismo e com a obscenidade. O sujeito através do projeto tortuoso do chiste libera a agressão represada, recalcada sendo, portanto uma expressão socialmente aceitável.

Para efetivação de um chiste é necessário a participação de três pessoas: o autor, aquele a quem o chiste vem; a segunda pessoa, sobre quem o chiste versa e a terceira pessoa, aquela que o escuta. É necessário um acordo psíquico entre o autor e aquele que o escuta, há uma identificação entre ambos. O processo se passa então, entre a primeira e a terceira pessoa, para que o riso aconteça. O riso é desmascaramento. É descarga de inibições.

Os chistes realizam uma tarefa subversora, jogando com o sentido das palavras enunciadas, velando e revelando a um só tempo um pensamento privado que vem a tornar-se público.

No chiste, o sujeito tomando a palavra e fazendo rir, desarma quem poderia criticá-lo.

Para concluir, podemos dizer que a análise é, para além de uma escuta diferenciada das formações do inconsciente, é principalmente uma leitura daquilo que é dito pelo sujeito, que sem o saber o diz. É dizendo aquilo que pensa, que não sabe que sabe, que justamente a verdade que diz respeito só a ele pode aparecer.

Bibliografia
1 FREUD, S. Os chistes e sua relação com o inconsciente. Edição Standard das Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1977. v 8.
2___ . Psicopatologia da vida cotidiana. Edição Standard das Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1977. v 6.
3 LACAN, J. O seminário – As formações do inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
4 _. O seminário – Os escritos técnicos de Freud. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1979.
5 CHEMAMA, Roland. Dicionário de Psicanálise. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

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